quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Série: Clarissa #02

Querido Deus,

Oi, sou eu, a Clarisse, lembra? Aqui estou eu, há um certo tempo até, com essa folha de papel nas minhas mãos sem saber o que escrever. Talvez porque eu tenha prometido que iria falar mais com Senhor e faz quase 4 meses que fiz essa promessa. Talvez porque esteja um pouco cansada por causa do meu tratamento. Talvez porque tenha esquecido. Ou simplesmente porque talvez eu não saiba o que falar...
O que eu sei é que agora Você é o único que pode me ouvir. Perdi a fala a cerca de 1 semana e isso tem sido um fardo pra mim. A minha querida Alice anda extremamente triste, apesar da tentativa de esconder isso. Ela quase não sai mais do quarto com medo de que eu precise de alguma coisa e isso tem me cortado o coração. Não queria vê-la jogar a vida fora assim, só pra cuidar de uma pobre velha como eu. Eu sei que o Senhor sabe o que faz, então se está na hora de me levar, que assim seja. Ela é jovem, bonita, inteligente, e tem um futuro promissor, sei disso! Então queria Te pedir pra tomar conta da minha filhinha. Sei também que já faz isso, mas não custa nada pedir de novo, certo?
E falando em jovem... Uma coisa me chamou a atenção há uns 2 meses atrás, mas como eu ainda não tinha tido a oportunidade de comentar, só agora estou dizendo. O apartamento aqui de frente foi ocupado, o que é bom, porque agora eu pelo menos tenho algo para olhar. E numa dessas olhadas, vi a jovenzinha moreninha. Ela tem o costume de ficar na varanda, o que a deixa mais visível ainda pra mim. Não sei o porquê, mas ela tem chamado a minha atenção. Sempre alegre, com aqueles aparelhinhos no ouvido que eu não sei o nome, ela me parece realmente ser uma boa menina. Mas de uns dias pra cá ela anda tão pra baixo, coitadinha, chorando até... Então, eu queria pedir também por ela agora. Não sou bem a pessoa mais indicada pra isso, e nem tenho motivos, mas... Se possível dê um pouquinho da minha força pra ela, eu quase não já estou precisando mesmo. Mostra que a vida é bem mais que isso, que a dor e a tristeza vão passar. Ela parece ser tão novinha. Aposto que é dor de amor. Ai, como eu sofria por causa do Antônio! O Senhor precisava de ver! Autoritário, com aquele jeitão que só ele tinha, grosso até. Era cada brigão. Teve um dia que ele jogou as flores que tinha trazido pra mim no chão e pisou, acredita? Isso só porque eu reclamei que ele estava atrasado. Mas eu também, sempre reclamona e teimosa! Sorte da minha Alice não ter puxado esse meu lado, doce que só ela. Eu e o meu Antônio vivíamos em pé de guerra, mas ele era o amor da minha vida. Ainda é, sempre será. Mas enfim... Até parece que estou esquecendo com quem estou falando, rs. O Senhor sabe de tudo isso e muito mais. Sabe o futuro da minha filha, sabe o futuro da jovenzinha do apartamento da frente, sabe o meu futuro. E o que eu sei é que tudo está nas Suas mãos mais que suficientes. Então, toma, pode tomar conta de tudo. Vou tentar cumprir a minha promessa de falar com Você mais vezes, mas não prometo conseguir. Sabe como é, sou apenas uma pobre velha. Quer dizer, me desculpe... Pobre não, riquíssima! Posso estar doente, sem poder falar, mas tenho tesouros preciosos que o Senhor me deu e isso faz toda a diferença. Muito obrigada, me faz um bem enorme conversar com Você, mesmo que tão pouco. Amém. (Agora que já sei que é isso mesmo que falam, rs.)

domingo, 10 de abril de 2011

Série: Clarissa #01

Querido Deus,

Sei que há muito tempo não converso Contigo. Aliás, desde a minha meninice sei que venho agindo como se Você não existisse e não fizesse diferença. Mas dizem que no fim é que você começa a pensar no começo, não é? Pois é...
Faz mais ou menos um ano e meio que eu descobri que estou doente. No começo continuei com a minha vida normalmente, afinal de contas, a doença não me fazia tão mal assim. Mas daqui alguns dias faz um mês que eu estou de cama, impossibilitada, doente, morrendo... Sei que pra muitos isso é uma coisa terrível, mas eu já estou nos meus 80 anos e sabia que um dia ou outro a minha hora ia chegar. É certeza, ela sempre chega.
Já vivi o bastante, fiz o que tinha de fazer e não me arrependo da vida que escolhi. Tudo que eu fiz contribuiu para que eu chegasse onde estou hoje e a única coisa que eu mudaria é o relacionamento que eu tive com o Senhor, ou Você, como preferir, ao longo do tempo (me desculpe pela falta de jeito em conversar com o Senhor, sabe como é...). Tenho 3 filhas maravilhosas e mesmo que só a Alice tenha ficado para tomar conta de mim, amo a todas igualmente. Afinal de contas, elas têm vida própria, não é? Não podem deixar de aproveitar a vida por causa de uma velha como eu. Sinto muitas saudades delas, é claro. Aliás, saudades mesmo eu tenho é do meu velho e único Antônio. Ah, como eu fui feliz ao lado dele! Uma pena que o Senhor o tenha levado antes de mim, esse foi um sofrimento que eu realmente gostaria de não ter experimentado.
Mas não é sobre nada disso que eu quero falar agora. Na verdade mesmo eu queria era agradecer. Agradecer, porque mesmo tendo dito no início dessa carta que eu sabia que havia chegado a minha hora, o Senhor tem me dado uma força incrível para lutar contra tudo isso e tem me abençoado. Passar um mês deitada numa cama sem nada pra fazer a não ser resistir à uma doença não é pra qualquer um. Lá no fundinho do meu coração eu tenho uma enorme vontade de continuar vivendo, uma enorme esperança de que tudo vai acabar bem. Todos esses fios e tubos ligados em mim de nada adiantariam se eu não estivesse lutando, sei disso. E sei que essa força vem do Senhor e eu agradeço por isso. Agradeço também pela minha linda Alice, que todos os dias cuida de mim com uma enorme dedicação. Ela é um presente!
Mas enfim, não quero tomar muito o Seu tempo... Só de ter dito essas coisas e ter certeza de que um ser como Você me ouviu, eu fico imensamente feliz. Peço perdão por ter demorado tanto para reconhecê-Lo, mas prometo fazer isso mais vezes. É um conforto pra mim. Aliás, falando em conforto, acho que já está na hora do meu remédio. A dor de cabeça voltou e já começou a me incomodar. Vou chamar a Alice. Beijos, e até outra chance.

Amém (acho que é isso mesmo que todo mundo diz no final, não é? rs).



créditos da imagem: http://www.wesleydocarekingston.websyte.com.au/site.cfm?/wesleydocarekingston/1/

ps: postarei as outras partes o mais breve possível, não deixem de ler.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Diretamente falando

Hoje no meu colégio houve uma certa discussão sobre religião. Como única evangélica da minha turma, sempre sou alvo de perguntas e o mais comum é eu ouvir coisas como "Ah, mas porque você não bebe e não vai em festas? É porque a sua igreja não permite?" ou "Mas vai dizer que você não sente vontade... Não tem nada demais", e eu sempre tento com o máximo de calma e clareza possível explicar todos os meus motivos. A primeira pergunta, por exemplo, eu ouvi hoje. Mas, o tempo que eu tive disponível para essa resposta não foi o suficiente, uma vez que a professora tinha acabado de entrar e já havia começado a anotar no quadro um exercício avaliativo enooorme pra fazer, então vou explicar aqui porque não fumo, não bebo, não uso drogas e nem faço as outras coisinhas cools que a maioria dos adolescentes de hoje fazem e acham a coisa mais normal do mundo.
Não faço essas coisas porque, além de não gostar e não ter a mínima vontade de fazer, elas não agradam o meu Deus. E essa questão vai muito além de seguir uma religião cegamente ou de não beber porque quem bebe vai para o inferno. Amo à Deus e faço isso com maior prazer.
Você pode não acreditar, mas eu vou te contar uma historinha agora. Desde muito, muito, muito, muito tempo atrás, antes mesmo de todas as criaturas nascerem e da Terra surgir, existe um Deus. Um Deus poderoso, grandioso, maravilhoso, amoroso e todas as outras qualidades com oso que você possa pensar. Ele vivia no reino dos céus, e haviam milhares de anjos feitos para sua adoração. Mas um anjo se rebelou e o desobedeceu. O preço, então, que ele teve que pagar por tal feito foi a morte. Como não havia no universo lugar para uma coisa tão horrível como a morte, foi criado o inferno. E até hoje esse anjo, com muitos outros que também desobedeceram a Deus, vive lá. Algum tempo depois, Deus nos criou... Perfeitos, à Sua imagem e semelhança, santos e puros de coração. Mas aquele mesmo anjo veio e plantou em nós a semente do pecado (com a nossa ajuda, claro). Como o pecado não pode conviver com a santidade divina e Deus é um Deus de palavra, deveríamos ter recebido o mesmo castigo que o anjo malvado recebeu. Mas, além de Deus de palavra, Ele é, acima de tudo, amor. E em nome desse amor, mandou seu único filho para restituir o sangue que precisava ser derramado como pagamento do pecado que cometemos. Esse filho, chamado Jesus, morreu então por mim, por você, por nós, para que não precisássemos morrer eternamente. Isso significa que quem O aceita como salvador vive eternamente. Mas não é nesse ponto que eu quero chegar. A questão é que o amor de Deus por mim é infinitamente grande e Ele me mostra isso a cada dia. O ar que eu respiro, a comida que eu como, a água que eu bebo, as roupas que eu visto, tudo é Ele que me dá. Todas as coisas desse mundo foram feitas pra que eu pudesse desfrutar. As estrelas, o céu, a lua, TUDO Ele fez. E sabe porque? Porque nos ama demais. E nos pede muita, mas muita pouca coisa mesmo em troca desse amor. As únicas coisas que Ele nos pede é que creiamos Nele, sejamos fiéis e O adoremos. E ser fiel inclui obediência. Então, eu acho que o mínimo mesmo que eu posso fazer para agradar um ser que faz absolutamente tudo por mim é deixar de beber naquela festinha que "não tem nada a ver". Porque isso O agrada e Ele deixa isso claro na Sua Palavra. Não farei uma coisa que eu posso, mas não me convém, e não me leva a nada. Porque pra mim, a vida não tem o mínimo sentido se Deus, o meu criador, não está feliz com as minhas atitudes. E eu não me importo de maneira alguma em estar por fora por causa disso. Não mesmo.
Tudo por causa do Seu amor.

quarta-feira, 16 de março de 2011



"- Saudosa, ao longe vês no céu a lua?
- Ó vejo sim...recordação fatal.
- Foi a luz dela que jurei ser tua durante a vida, e na mansão final."
(Noivado no Sepulcro - Soares de Passos)

Eu queria que alguém olhasse nos meus olhos e me dissesse "eu te amo" sem precisar dizer nada. Queria que alguém segurasse as minhas mãos com tamanha força e carinho, que fizesse todas as minhas dúvidas se tornarem certezas. Queria alguém que me aquecesse com um sorriso, que brincasse com os meus cabelos e que fosse, acima de tudo, meu melhor amigo, meu cúmplice. Queria alguém que olhasse pra mim de um jeito tão intenso que fizesse eu me sentir única, especial, indispensável e inerente pela primeira vez. Na verdade, eu quero mesmo (e muito) um amor sincero, VERDADEIRO, pra vida inteira. Será que alguém ainda sabe o que essas palavras significam?

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Unidade

O tempo é algo que decididamente não volta atrás. Com sua efemeridade, ele é sempre o culpado pelos amores esquecidos, amizades abandonadas, memórias perdidas e muitas vezes se torna a desculpa perfeita para a estagnação da maioria das pessoas. Não uma estagnação física, de lugar, mas de sentir. Eu sou um exemplo disso.
Quando completei quinze anos de casada já havia desistido do amor há um bom tempo. A rispidez, falta de cumplicidade e carinho do meu dia-a-dia conjugal vinham me cansando e me corroendo por dentro cada vez mais, causando um desgaste cada dia um pouquinho maior na minha alma outrora apaixonada e vívida. A ignorância e brutalidade presente nas palavras e olhares trocados entre ele e eu já eram mais que comuns e pra mim não havia mais esperança. Qualquer sentimento bom e otimista em relação ao meu marido já havia sumido e eu continuava com ele por continuar, muitas vezes controlando uma vontade absurda de me sentir livre daquilo logo. Mas houve um dia, um único dia, em que eu deixei tudo de lado.
Era o aniversário dele e, influenciada por antigas (e preciosas) amigas, decidi fazer uma surpresa. Um jantar romântico. Achei a coisa mais ridícula no início e mesmo organizando tudo meu coração ainda relutava em aproveitar toda a "expectativa" que rondava o preparo do jantar. Tudo pronto, comida na mesa, velas acesas, filhos fora de casa e eu, esperando, num vestido verde de cetim comprado especialmente para a ocasião. Me sentia um desastre total, desajeitada, boba por tentar ter um jantar romântico à luz de velas em plenos quarenta anos. Amor, frio na barriga, isso era coisa pra gente jovem. Quanta bobagem da minha parte!
Depois de uns quinze minutos de espera ele chegou. Imaginei que fosse rir de mim ou agir indiferentemente como sempre fazia, mas depois de analisar cada pequeno detalhe da garagem que improvisava um cenário de filme, ele apenas sorriu. E um brilho intenso tomou conta dos seus olhos, lutando contra as lágrimas que tentavam se formar. Naquele momento todas as mágoas ajuntadas ao longo dos anos foram esquecidas, o enorme muro que o tempo (sim, ele!) ajudou a construir entre nós foi derrubado e, depois de muito tentar, eu consegui ver, mesmo que lá no fundo, o rapazote por quem me apaixonei há trinta anos atrás. Fiquei perplexa diante daquilo, não conseguia acreditar. Ele ainda estava lá! O amor da minha vida ainda estava lá, com o mesmo sorriso iluminado, com as mesmas mãos que um dia seguraram as minhas com amor e me deram segurança, com os mesmos olhos que me seguiam pelas ruas e me aqueciam com tanta ternura e admiração, com o mesmo coração que tanto me amou e um dia foi meu. Que ainda era meu. Ele ainda estava lá e tudo estava em seu devido lugar naquela noite.
Quando o jantar acabou e as crianças já estavam de volta, em suas camas, nos deitamos abraçados. E apenas isso bastou. Palavras não precisaram ser ditas, nada precisava ser feito a partir dali. Eu via um novo caminho à nossa frente, iluminado, pronto pra ser trilhado por nós dois, juntos, como um só. Porque naquele momento eu senti que mesmo que o tempo passe e mesmo que novos machucados sejam feitos em nossos corações, sempre vai haver um momento em que tudo será resgatado. Inclusive o nosso amor. E é exatamente por isso que vai valer a pena.




Esse texto é uma história avulsa, mas é verdadeiramente e significativamente meu. Espero não ter decepcionado depois de tanto tempo.Um beijo.